quarta-feira, 13 de setembro de 2017

O ensino da língua culta x ensino da variedade linguística

O ensino da língua culta x ensino da variedade linguística

Os professores de língua materna vivem um dilema constante: ensinar a língua culta ou pautar o ensino na análise das variedades linguísticas? Esse questionamento tem levantado promissoras discussões, às vezes, nem tão amigáveis até mesmo entre os próprios linguistas. A verdade é que se almeja um direcionamento capaz de situar o ensino de língua materna e que possa amenizar dúvidas sedimentadas.
 Ensinar a língua culta aos alunos parece consenso entre os professores, porém, como ensinar é que tem provocado contendas. Se por um lado, o ensino pautado na variedade culta tem suas vantagens ao aluno, por outro, o que dizer do ensino da variedade respeitada imposta a alunos que nem tampouco conseguem assimilar competentemente a língua culta prestigiada socialmente e detentora de um poder ideológico incontestável.  
Outra constatação é verificável quando se põe em discussão o ensino da língua culta versus o ensino de outras variedades linguísticas. Diz respeito à situação comunicativa do aluno: assim como ele pode vergonhar-se em usar, muito deficitariamente, o que aprendeu do português “culto” em um ambiente social que prestigia esta variedade, não se encontra também à vontade em forçar naquele e em seu meio social um nível de língua que de fato não incorporou para o seu repertório linguístico.
Tornar o aluno competente nos diversos usos da língua é o caminho a ser trilhado na sala de aula, todavia, tem-se enfrentado uma dificuldade gigantesca em relação ao ensino-aprendizagem de português, em se pretender levar o aluno a incorporar uma outra variedade de língua que não seja aquela à qual vive exposto no seu dia-a-dia e, isso, recai sobre as metodologias adotadas, ou seja, no como ensinar. 
Muitas são as metodologias para se trabalhar o ensino aprendizagem de língua materna do ensino fundamental ao nível superior. E a conclusão mais imediata a que se pode chegar é a de que os ambientes educacionais não têm conseguido propiciar ao aluno situações e atividades diversificadas e concretas[1] que favoreçam a competência linguística para se usar, quando necessário, a variedade culta-padrão e/ou variedades menos prestigiadas. Foi exatamente pensando nessa questão que propositalmente optamos em titularizar o subcapítulo em questão “O ensino da língua culta x ensino da variedade linguística”, haja vista a maioria dos professores de língua assim conceber tal prática de ensino. Por isso, não obstante, ouvimos professores se questionando sobre o que ensinar; ressaltamos que não se trata de ensinar ou a língua culta ou a variedade linguística, e sim, apoiar-se em metodologias capazes abarcar o ensino de todas as variedades, pois a língua culta não deixa de ser, outrossim, uma variedade existente na sociedade. 
Em relação ao ensino das variedades não cultas? Será que estas também não deveriam ser objeto de estudo na sala de aula, tendo em vista que toda língua é constituída por variedade que, por razões estritamente linguísticas, equivalem-se?
A intenção de beneficiar o aluno com o domínio da língua culta, desrespeitando todo cabedal linguístico que ele faz uso, pode provocar consequências drásticas: ou o aluno limita seus atos comunicativos ou não adquire habilidades suficientes para se expressar por meio da variedade que lhe é imposta, tendo em vista a falta de eficiência no ensino da língua culta (BORTONI-RICARDO, 2005, p. 15). O fato é que o aluno ainda não vê sua variedade de língua sendo trabalhada com efeito.
Referência
­­ BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Nós cheguemu na escola, e agora? Sociolingüística & educação. São Paulo: Parábola, 2005.



[1] Marcuschi (2001) apresenta sugestões metodológicas interessantes acerca do ensino aprendizagem da variedade culta.

sábado, 18 de fevereiro de 2017

A LÍNGUA PADRÃO

Conforme o registro escrito da história dos estudos linguísticos, a padronização da língua é historicamente delineada pelos seus falantes. Essa padronização é determinada mediante a realidade cultural, política e social de cada época. Como a realidade sofre modificação diacronicamente, a tendência é que o que se considera como forma padrão hoje pode tornar-se não-padrão, e o que é considerado não-padrão pode ser estabelecido como padrão. A língua, por estar indissociável à sociedade acompanha esse transcurso, embora tenhamos a ignota pretensão de mantê-la estática, imutável. 
Representada por um conjunto diversificado de formas linguísticas, ela constitui um dos elementos formadores e responsáveis pelo desenvolvimento da sociedade e, por esse motivo, deve atender a todos. E é justamente nesse ponto que se torna relevante o seu estudo, quando concebido por meio de um prisma sensível e atento às sutilezas concretas de usos discursivos, de forma que todas as variedades da língua recebam um tratamento respeitoso, sem a preconização de se estabelecer unicamente uma variedade dominante, que exerça total supremacia e seja excepcionalmente a correta, a padrão, até porque nenhum registro linguístico é uniforme quando usado em situações adversas, mesmo aquele condecorado pela comunidade dos letrados, o registro padrão ou língua padrão admite variações em diferentes sentidos.
Forçar as pessoas a falar e escrever igualmente, tendo como recurso o mesmo padrão de linguagem, significa ignorar as diversidades de comportamentos linguísticos existentes em nosso meio, cada um atuando de maneira particular, com o propósito de atender adequadamente suas necessidades. Daí, não ser recomendável que se intitule esta ou aquela variação linguística como sendo a língua padrão, sob o risco de inferiorizar outras formas, que podem ser até mais apropriadas a determinados contextos.
A língua padrão na sua gênese é a língua idealizada pelo poder político, econômico e social. Deseja-se estar no topo da cadeia, justamente no lugar destinado as classes privilegiadas, detentoras do conhecimento sistematizado, escolarizado, deste modo intocável, com total credibilidade, referência a todas as pessoas.
Para assegurar o cultivo da língua padrão vários direcionamentos foram estabelecidos. Um deles é a própria instituição escolar que trabalha para transmitir e conservar a língua "correta", “exata”. Os próprios usuários da língua fortalecem outra frente que luta para apropriar-se a língua padrão, visando atenuar a censura, discriminação e empecilho à promoção social.
São inegáveis as vantagens à existência da língua-padrão, porém descrevê-la rigorosamente ou dizer onde vamos encontrá-la tem ficado cada vez mais escasso. As gramáticas tradicionais, como já mencionamos, baseiam-se normalmente em exemplos de textos da literatura clássica, que, muitas vezes, estão distantes do padrão linguístico real do português Brasileiro até mesmo o escrito . Portanto, se até mesmo os falantes da norma culta, aqueles que têm acesso às regras gramaticais padronizadas, incutidas no processo de escolarização, exprimem-se usualmente contrários a estas regras, podemos, então, considerá-las como norma ou língua padrão/culta?
Todavia, justificamos a necessidade do ensino da língua-padrão desde que ela seja colocada, linguisticamente, como uma variedade igual às outras, mas que usufrui de um prestígio social diferente por ser a língua do poder político, econômico e social. Assim, a ênfase nessa diferenciação contribui para que o aluno perceba nas formas linguísticas o valor intrínseco de cada uma e o tratamento social que certas variedades adquirem nos estratos das sociedades de cada período histórico.

sexta-feira, 20 de março de 2015

TECNOLOGIA EDUCACIONAL




De acordo com Masetto (2007, p.143) “num processo de aprendizagem o uso de tecnologias evidentemente também se alterará”. Como o processo de aprendizagem abrange o desenvolvimento intelectual, afetivo, o desenvolvimento de competências e de atitudes, pode-se deduzir que a tecnologia a ser usada deverá ser variada e adequada a esses objetivos. 
A tecnologia educacional possui uma estreita relação com a alfabetização tecnológica, e que os principais cenários onde as mesmas atuam referem-se à escola e a sociedade, como muito bem é colocado pelo autor, afinal de contas não há ambiente melhor para a realização desse debate que o meio educacional e o meio social, onde atuam nossas crianças e profissionais da educação e a sociedade em geral.
A escola como principal meio de formação das crianças e dos jovens, que serão os representantes da sociedade no futuro, tem como dever agregar ao seu cotidiano o aprendizado tecnológico, pois na sociedade atual em que vivemos a tecnologia, se usada de forma positiva, pode ser um grande instrumento de aprendizagem e formação intelectual e critica do individuo. Mas a tecnologia só resolverá os problemas do mundo se for posta a serviço da humanidade, e não usada apenas para aumentar o poder de alguns grupos e nações.
Embora se perceba a importância de relacionar o meio escolar com aprendizado tecnológico, esse assunto ainda desperta muitos questionamentos, como por exemplo, o modo de preparar os docentes pedagogicamente para desempenhar um papel atuante junto aos alunos sobre esse tema. A tentativa de implantação da tecnologia educacional não é uma discussão implantada recentemente no Brasil, essa discussão já vem sendo travada desde os anos 60 aqui no Brasil, mas nesse período, a tecnologia educacional estava fortemente ligada ao tecnicismo, cujo principal objetivo era apenas formar mão-de-obra qualificada para ser inserido no mercado de trabalho.
De acordo com Tajra (2000) no inicio da introdução dos recursos tecnológicos na área educacional, houve uma tendência a imaginar que as tecnologias iriam solucionar os problemas educacionais, podendo chegar, inclusive a substituir os próprios professores. No entanto, com o passar do tempo, percebeu-se a possibilidade de utilizar esses instrumentos para sistematizar os processos e a organização educacional e uma reestruturação do papel do professor.
A partir dos anos 80 com o advento da abertura política e democrática em vários setores, inclusive o educacional, começa-se a partir de então a produção de trabalhos de cunhos mais critico na área educacional referente à realidade que estamos inseridos.
A tecnologia educacional também não ficou de fora desse novo contexto, assim como as outras áreas esta também sofreu um aprimoramento nas questões referentes à utilização da tecnologia na área educacional. Debate-se que a tecnologia educacional deve está pautada a atender e entender os problemas tidos na realidade das pessoas, colocando em um ponto de análise crítica e fazendo isso juntamente com a metodologia educacional implantada no meio escolar, objetivando com esses métodos proporcionar uma vida melhor e provocar mudanças positivas na realidade das pessoas através da educação.
O debate apresentado hoje com relação ao tema tecnologia da educação gira em torno de um discurso que busque principalmente adequar as necessidades do individuo dentro de um cenário que está inserido na era da informação ligando esse cenário com a educação.
Percebe-se de maneira clara e objetiva que os estudos realizados dentro do campo de conhecimento da tecnologia educacional, têm por principal objetivo gerar uma relação direta, recíproca e positiva entre a tecnologia e a escola, como principal meio educacional, visando desenvolver um caráter preparatório dos alunos dentro do contexto das novas tecnologias. É importante ressaltar que não é válido apenas que os alunos aprendam a utilizar essas novas tecnologias, mais que os utilize de forma racional e crítica (MASETTO, 2007).
Almeida (2008, p.19) afirma que a inserção da tecnologia dentro das escolas possibilita ao aluno a construção de um senso crítico junto a essas tecnologias, impedindo-o dessa forma, que se torne um mero usuário dos instrumentos tecnológicos, ou seja, que o aprendizado deixe de acontecer de forma crítica e reflexiva, permitindo que o mesmo se torne um alienado. No entanto, isso só poderá ser feito se houver também um bom preparo dos docentes, no sentido de ensinar os alunos o porquê de utilizar e como utilizar a tecnologia educacional.
É importante destacar que não basta simplesmente inserir, sem critérios, os recursos tecnológicos no dia-a-dia da sala de aula, os alunos não determinarão a ação, pois a maneira como esta inserção é feita influencia diretamente no bom aproveitamento de professor e aluno, de tais recursos. Simplesmente mostrar um filme aos alunos não fará muita diferença.
Paulo Santiago de Sousa

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, M. E. de. Educação, ambientes virtuais e interatividade. In: SILVA, M. (Org.). Educação Online. São Paulo: Loyola, 2003.

MASETTO, Marcos Tarciso. Mediação pedagógica e o uso da tecnologia. In: MORAN, José Manuel; MASETTO, Marcos T.; BEHRENS, Marilda Aparecida. Novas tecnologias e mediação pedagógica. 13. ed. Campinas, SP: Papirus, 2007, p.133-173.

TAJRA, S. F. Informática na educação: novas ferramentas pedagógicas para o professor da atualidade. São Paulo: Érica, 2000.

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

NORMA CULTA



A norma culta, em uma definição imediata, é a norma de língua usada pelos falantes mais escolarizados da língua, aqueles que têm maior proximidade com a modalidade escrita e, portanto, possuem uma fala mais próxima das regras de tal modalidade. É a “ensinada” na escola, empregada nos textos oficiais, científicos e literários.
Todavia, o caráter pernóstico do adjetivo “culto” pode render pressupostos equivocados, como oposição a uma norma “inculta”, totalmente desprovida de cultura. A existência de tal presunção provoca comentários como “fulano não sabe falar português” ou “fulano é ignorante em português”, desconsiderando que mesmo entre os falantes mais escolarizados, a língua varia no eixo do estilo em relação aos contextos e aos níveis de formalidade, ficando cada vez mais distante da norma estipulada pela gramática.
Intitular uma norma como culta é estabelecer para um falar a concepção de “certo”, “correto” e para outros de “errado”, “incorreto”. Bagno (2002, p. 42-43) polemiza o tema, afirmando que a norma culta carrega consigo um rótulo já sedimentado na sociedade. “É mais um preconceito do que um conceito propriamente dito”, de que existe apenas uma forma certa, modelar, de falar um idioma; justamente aquele encontrado nas obras literárias de renome e nos tradicionais compêndios gramaticais, sendo, dessa forma, o modelo de língua prestigiado e idealizado por uma classe minoritária de cidadãos seletos socioculturalmente.
Em concordância com Bagno (2002), Antunes (2007, p. 87) instrui que “a designação de norma culta não é das melhores, do ponto de vista ideológico, pois favorece a suposição de que aqueles que a adotam é que são cultos, têm cultura”, e essa concepção causa “efeitos discriminatórios” aos que não dominam tal norma, os pertencentes às classes sociais com menor acesso, principalmente na educação formal.   
Bortoni-Ricardo (2004) propõe situações que influenciam a diversidade linguística e nos indica as relações de classes geradoras das estruturas linguísticas dominantes.
Em toda comunidade de fala onde convivem falantes de diversas variedades regionais, como é o caso das grandes metrópoles brasileiras, os falantes que são detentores de maior poder – e por isso gozam de mais prestígio – transferem esse prestígio para a variedade linguística que falam. Assim, as variedades faladas pelos grupos de maior poder político e econômico passam a ser vistas como variedades mais bonitas e até mais corretas. Mas essas variedades, que ganham prestígio porque são faladas por grupos de maior poder, nada têm de intrinsecamente superior às demais. (p. 33)
Não agimos de forma preconceituosa porque tomamos como referência aspectos intrinsecamente linguísticos. A língua em si não apresenta parâmetros que nos indique a bipartição “certo e errado”, não é ela que está no cerne da discussão e sim a importância de seus usuários[1]. É a sociedade que se baseia em realidades socioculturais favorecidas e cristaliza modelos de língua exemplar.  
A norma culta não deriva de nada intrínseco ao português. Não há formas ou construções intrinsecamente erradas ou certas [...] Assim, o certo ou errado deriva apenas de uma contingência social. Em todas as comunidades sempre se atribui à determinada classe uma ascendência sobre as demais. A classe de prestígio dita às normas de comportamento, a moda, o gosto por certo tipo de música... Assim também a escolha das variedades linguísticas entre as que estão à disposição dos falantes. Ao escolher uma, essa classe condena as outras variedades (CASTILHO, 2002, apud Bagno, 2004, p. 185).
Dessa forma, a imposição da chamada norma culta em detrimento de outras normas, configura a perda da identidade de um determinado segmento social. Com isso, não se consegue uma compreensão mais completa dos fatos linguísticos permitidos pelo sistema linguístico. Ao mesmo tempo, deixar de ministrá-la nas escolas permite impedir o acesso do aluno a um estrato social considerado superior, assim como seu acesso à tradição cultural escrita. Num caso e no outro, há prejuízo no desenvolvimento da competência comunicativa. Portanto, é imprescindível que o aluno compreenda o maior número possível de normas a fim de obter sua plena integração na comunidade em que está inserido.
O cuidado em perpetuar a forma norma culta consiste exatamente no fato de se impor uma dicotomia: de um lado a norma culta “certa”; do outro, a norma popular ou coloquial “errada”. Pois bem, todos nós temos cultura, sabemos lidar cotidianamente com as mais diversas situações sociais e comunicativas. Então, o porquê da discriminação, somos sim, cultos. Isso é diferente de não ter domínio de uma variedade linguística.[2]    




[1] Bagno (2002, p.66) sugere que nós passemos a usar a expressão variedade de prestigio em vez de norma culta.
[2] Bagno (2002, p. 50); Antunes (2007 p. 87-88).

Cenários da educação brasileira


Cenários da educação brasileira
Os objetivos expressos nas leis que regem a educação brasileira sinalizam caminhos que podem amenizar muitas problemáticas contemporâneas. No entanto, a sociedade civil não se vê contemplada efetivamente nas ações que qualificam e dignificam a vida do cidadão.
São usados alguns meios para se verificar a qualidade da educação brasileira, como os exames nacionais, muito embora esses exames não apresentem realmente a realidade da educação em muitos lugares do país. Com os dados inquiridos nos exames espera-se que haja um projeto de intervenção no sentido de melhorar a qualidade do ensino-aprendizagem; projeto este que pouco saiu do papel.
É sabido, que os objetivos expressos nas leis apresentam inúmeras intencionalidades, que ultrapassam as fronteiras da qualificação da educação; aliás, é esta a intencionalidade que a sociedade civil mais espera, e que está sendo ofuscada por interesses particulares.
            Neste jogo de interesses, não se almeja ao cidadão ascensão social, antes se quer pessoas que sejam manipuladas com facilidade, incapazes de exercer a sua cidadania plena. Nesse sentido, com os avanços nos diversos campos do conhecimento, especialmente no tecnológico, a política mundial exige que os países apresentem resultados satisfatórios quanto aos seus índices educacionais. E por isso, procede-se na realização de exames que apresentem tais resultados.
O fato é que se esperam medidas urgentes que realmente interfiram cotidianamente, não só nos resultados dos exames aplicados, mas na realidade escolar da educação brasileira. Por isso, se espera que a aplicação de exames vá além da prestação de contas e da camuflada responsabilização social que ostenta interesses políticos, caminhando rumo à seriedade e a dignidade humana.